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DESVER

FESTIVAL DE CINEMA 

UNIVERSITÁRIO

DE MATO GROSSO DO SUL

Respirando o Sertão do Amanhã: Um Olhar Sobre Sertão 2138

  • Foto do escritor: Alécio Luís França
    Alécio Luís França
  • 6 de nov.
  • 2 min de leitura

Quando o sórdido ar terrestre adentra suas narinas, Beatriz tosse; tosse tanto, que não aguenta, e coloca seu respirador. O sol a fustiga — fustiga a ela e à terra; o tempo a castiga — castiga a Terra e a ela; tempo passado que se fez presente, presente quente. Este é Sertão 2138, projeto imaginado e concebido por Deuilton B. Junior na forma de curta-metragem.

A começar por seus elementos formais, nota-se de cara que o diretor demonstra uma atenção detalhista quanto à construção visual de seu filme. Seus enquadramentos são cuidadosamente pensados; os personagens, no plano, bem alocados; há uma busca clara por valorizar os contornos da vegetação sertaneja, e um ávido apreço pela iluminação e composição harmônica de suas cenas.

Sua estética, inspirada nos grandes clássicos da ficção científica, ao mesmo tempo que se apoia em convenções contemporâneas de se fazer cinema — sobretudo curtas-metragens — também resgata elementos tradicionais do gênero. O uso de cortinas (wipes), por exemplo, exemplifica esse resgate — sendo esta uma transição, atualmente, pouco usual, mas amplamente empregada na trilogia original de Star Wars.

Ao adaptar essas convenções do gênero à paisagem e à cultura do Nordeste, Deuilton cria uma ambientação única — um universo novo, impregnado de regionalidade. Os corpos negros, brasileiros e nordestinos, tão raros no sci-fi, aqui encontram visibilidade. Vemos em sua proposta, um evidente fascínio por esse sertão futurista e diverso — expressão do desejo de ver a ficção científica florescer em solo brasileiro e, sobretudo, de ver-se representado.

Todo esse apelo visual da obra é construído com muito primor. Contudo, talvez por focar demais na forma, o filme se disperse um pouco em seu conteúdo. Ao terminar, tive a impressão que o diretor parecia dividido quanto ao seu discurso. Ao recorrer a diversos temas — poluição, luta de classes, educação, desigualdade — o autor peca ao não se aprofundar em nenhum deles. Ora parece querer discutir o meio ambiente, ora a mais-valia, flerta até mesmo com questões raciais; mas, no fim, todas as pautas acabam rasas e o discurso, inconclusivo.

Não atribuo a fragilidade do curta a uma falta de talento do diretor ou roteirista. Pelo contrário, acredito que ele demonstra pleno potencial e criatividade para contar uma boa história — talvez o problema resida justamente aí. Seja por descuido ou por entusiasmo excessivo, ao idealizar o projeto, o autor parece ter tentado abraçar temas demais em tempo de menos.


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