No fim, o que nos sobra são as memórias
- Gabriel Reis

- 5 de nov.
- 2 min de leitura
O Palio de minha mãe é um filme de arquivo, ou seja, só utiliza imagens já previamente gravadas, sejam pessoais ou de propaganda. Existe um grande desafio na hora de realizar um filme desses, normalmente as pessoas não tem disponível a quantidade de material pessoal necessária para desenvolver uma história envolvente. É nessa dificuldade que esse filme se destaca com uma ideia muito interessante ao identificar um ponto em comum nessas memórias: um carro.
Achei muito interessante essa ideia de retomar um objeto do passado que para muitos pode permanecer no esquecimento. Esse mote se torna mais interessante ainda quando consideramos que poucos objetos que fazem mais parte de nossa vida em sociedade como os carros. A sociedade brasileira é inegavelmente rodoviária, temos a presença dos carros no nosso dia a dia em praticamente todos os momentos da nossa existência, seja a presença da imagem do carro ou o desejo de comprar um carro.É algo que se tornou tão comum que não paramos normalmente para pensar a quantidade de memórias e experiências que envolvem os automóveis.
Me peguei relembrando de carros que minha mãe teve em minha infância e é realmente extraordinário como o uno verde da minha mãe atravessa momentos cruciais da vida dela, minha e de minha irmã. Acredito que a fácil identificação do espectador com esse tema transforma esse filme em algo muito universal. É essa universalidade que carrega a potência por trás da obra e me causou o seguinte questionamento: quantos objetos inanimados acabamos por, sem intenção, impregnar de vida durante nossa trajetória neste planeta?
Ao iniciar a obra com uma propaganda antiga, na época quando o Pálio estava sendo inicialmente fabricado, o próprio filme faz um interessante paralelo entre o objeto inanimado por si só e todo o sentimento que atribuímos ao mesmo no decorrer da vida. O carro nessa propaganda não é nada mais do que simplesmente um produto, como qualquer outro das centenas de carros que o brasileiro vê todo dia, nas lotadas avenidas das capitais, nas estradas, nos filmes e nas propagandas da televisão. Ao ordenar paralelamente estas imagens de carros com as percepções públicas do que é um carro em contraposto a um carro com sentimentos atribuídos profundamente pessoais em decorrência do tempo de uso, o filme me intrigou bastante, fazendo-me refletir sobre este fenômeno, quando o homem atribui uma “alma” para um objeto inanimado.
Seria este filme somente um exemplo prático do fetiche da mercadoria, nada mais do que uma obra sobre um sentimento planejado em uma sala de reuniões? Acredito que não. No fim o maior trunfo de O Palio da minha mãe é utilizar de algo tão mundano como um carro para nos fazer olhar para trás em nossas vidas e relembrar momentos tão importantes que acabamos por deixar no passado. Ele celebra e evidência a importância da preservação de nossa história e em consequência, nossas memórias.



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