Abertos a coisas novas, mesmo que sejam velhas possibilidades
- Wilgner Nascimento

- 5 de nov.
- 2 min de leitura
Em Lírios acompanhamos Rita (Alice Anayumi) e Gabriel (Danilo Baz), amigos desde a infância embarcando em uma viagem de 2 dias para a Chapada dos Guimarães, onde os dois se veem diante de um sentimento romântico crescente um pelo outro. Eles são amigos desde criança. Gabriel, para além de saber fazer o prato favorito de Rita, acompanhou de perto o processo de entendimento da amiga como mulher trans e sua eventual transição.
É de Rita que Lírios extrai toda a sua potência. Anayumi imprime à personagem camadas de insegurança, leveza e doçura, mas também de obstinação, resiliência e tenacidade, que cercam não somente a vida de uma mulher trans, mas todos aqueles que amam e sonham. Isso faz da jornada interna de Rita o ponto mais intenso da trama.
Mas nem tudo são flores: o mesmo não se pode dizer de Gabriel e dos personagens do elenco de apoio. Todos cumprem suas funções e entregam o que o roteiro exige, porém, sem ultrapassar o limite da funcionalidade. A disparidade entre os arcos internos dos protagonistas e seus coadjuvantes fracos, faz com que Lírios perca tração toda vez que o foco não está em Rita.
“Estejam abertos a coisas novas, nem que sejam velhas possibilidades.”, diz a mãe de Gabriel antes do filho e sua amiga embarcarem em sua viagem. E é nesse ponto em que a obra mais escorrega. Ao abraçar de maneira pouco contida os velhos clichês do gênero, Lírios desperdiça a oportunidade de se tornar algo tão especial e singular quanto sua protagonista. Em diversos momentos, o roteiro abre mão de diálogos ou desenvolvimentos mais profundos em favor de cenas piegas ou previsíveis. O problema não está exatamente na existência de tais cenas, mas no excesso delas.
Tecnicamente, o curta é bem executado. A edição e a montagem tropeçam em alguns momentos, com cortes pouco coesos e sequências mal conduzidas, como a sequência de Gabriel e Rita no carro a caminho da rodoviária, mas não sendo isso algo que comprometa totalmente a experiência. O verdadeiro destaque está na direção de fotografia de Lucas Arruda. Ainda que simples, ela constrói uma atmosfera eficaz por meio do uso expressivo de luzes — tanto naturais quanto artificiais —, que iluminam, pouco a pouco, o sentimento da dupla de protagonistas ao longo da narrativa.
Tudo isso, amarrado a uma trilha sonora competente, torna Lírios uma experiência agradável, ainda que um pouco comprometida pelas derrapadas mencionadas acima. Aline Anayumi é magnética, e seu carisma eleva o filme a ponto de suas falhas não roubarem tanta atenção quanto poderiam.



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