No ano de 2027, uma cidade tem seu dinamismo composto pelo movimento da fumaça que a cerca e define a cor cinza de seu céu. O alto nível de poluição do ar leva ao escurecimento do verde da natureza e à necessidade do uso de máscaras por parte das pessoas em meio a esse ambiente. “Supremacia da Fumaça” busca criar uma reflexão acerca da exploração dos “grandes negócios” aos diversos recursos do planeta e dos grandes impactos negativos causados por essa ao meio ambiente e à sociedade, seja visual ou psicológico.
O curta-metragem, dirigido por Marcelo Mendes Gomes, trabalha sua mensagem através de uma narrativa fictícia e da contribuição conjunta de seu roteiro e elementos técnicos. A trajetória da personagem protagonista pelas locações da trama expõe de forma coerente a situação presente no universo distópico criado, apresentando diversos símbolos visuais que explicitam o estado daquela pessoa e da própria cidade de Vitória, abstendo-se da presença de falas.
A imersão promovida por Supremacia da Fumaça se relaciona diretamente com sua identidade visual. O trabalho da direção de arte de alocar informações em cartazes presentes nos cenários auxilia no enriquecimento da experiência do espectador e em seu melhor entendimento acerca da mensagem trabalhada no curta Um desses elementos, e que recebe um plano de destaque, traz a imagem de uma mulher com um óculos de realidade virtual, aparentando segurar um bebê que é visível apenas para ela, fugindo de sua realidade, assim como desejam as pessoas desse universo. Textos vistos no celular da personagem de Luísa Costa são mais diretos e expositivos em relação à criação de atmosfera da trama, mas o uso do formato de manchetes de notícias rolando na linha do tempo de uma rede social não destoa do futuro apresentado.
Concomitantemente, a criação da identidade e atmosfera continua ao longo do trabalho da direção de fotografia e edição da obra. O alto contraste da imagem realça as cores vivas utilizadas nas artes vistas nos locais por onde a protagonista passa, mas também acentua a falta delas em meio a um centro urbano muito industrializado. Em conjunto a isso, há a escolha da redução da saturação das cores do céu, da água e de outras estruturas na pós-produção, que, além de coerente com as circunstâncias perigosas do universo do curta, acaba por servir como forma de expressão para os sentimentos cotidianos dos personagens que ali vivem, excluindo a necessidade da explicitação por meio de expressões de pessoas utilizando máscaras faciais, mesmo que haja a ação na protagonista.
Do mesmo modo, os sons inseridos na edição de Supremacia da Fumaça atuam guiando e auxiliando o desenvolvimento dos ocorridos durante sua trama, trabalhando para enfatizar a mensagem da obra de forma desvendável ao espectador. Por exemplo, a inserção de uma música eletrônica pouco tempo após o início do curta-metragem, enquanto algumas locações são exibidas, realça o plano de fundo “futurístico” em que a história está inserida, introduzindo seu universo base. Então, um plano detalhe revela os fones de ouvido de onde provém a música, que ao serem retirados dão espaço a um breve momento de silêncio, logo substituído por uma trilha dramática, que busca transmitir maior seriedade ao início da exposição das problemáticas daquele mundo.
Ademais, dentro de seus elementos de maior destaque, realço a direção de Marcelo Mendes Gomes, que trabalha junto de outros fatores citados para a realização de uma efetiva construção de ritmo, mensagem e atmosfera. Valores esses representados pela apresentação de lugares da cidade e da fumaça no ar, por planos dos personagens andando e correndo pela metrópole também garantindo uma espécie de “dinamismo incomodativo” ao curta – obtendo êxito ao representar esses elementos em um contexto distópico. Além disso, o fato de a direção em conjunto ao figurino não revelar os rostos de seus personagens por inteiro, mesmo quando a personagem principal retira sua máscara, se torna uma escolha enriquecedora à história da obra, já que aparenta representar que o sucedido com a protagonista pode ocorrer com qualquer um da futura Vitória.
“Supremacia da Fumaça” trata de uma discussão já muito exposta em obras ao longo do tempo, entretanto, busca uma diferente abordagem em relação ao comentário acerca da causa da problemática analisada. O foco de sua crítica está abertamente direcionado aos grandes órgãos, como poderosas empresas e o governo, e não visa conscientizar o telespectador acerca de mudanças de hábitos, já que, dentro da obra, essas parecem insignificantes próximas ao impacto negativo ocasionado por indústrias e outros processos de exploração de materiais. Isto fica claro próximo ao fim da obra quando, após ter uma crise de tosse, a protagonista toma a decisão de jogar o cigarro que estava fumando no lixo, sendo esse um dos últimos planos do curta, que é substituído na montagem por um plano aberto da chaminé de uma fábrica liberando uma grande quantidade de fumaça. Ou seja, o ar tóxico natural desse mundo não impede nenhum de seus personagens de sofrerem dos mesmos problemas que teriam ao fazer uso de cigarros. Não importando as suas ações, a supremacia da fumaça continua.
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